´Eh! bien, prenez la main De l´avenir puissant qui vous attend.´*

*trecho de poesia de Victor Hugo (1802/1885)

Depois de quase três meses fora de São Paulo, preparo as malas para zarpar...
Agora entendo que merecia este tempo, pra cuidar do que estava degringolando.
Percebi que estava estressada, que estava forçando estômago, corrente sanguínea, ovários, olhos, espírito e mente.
Está tudo zerado agora e ainda fiz um óculos!
Pois como disse minha oftalmologista, eu não tinha mais braços para ler. Isso mesmo, não aguentava mais sentar na cadeira, jogar livro e jornal no chão e então começar a leitura,´acreditando [que] na distância entre nós´, eu conseguiria decifrar o que estava escrito.

Como uma fênix cinzenta retomo minha trajetória. Na mala não coloquei as últimas tendências da moda (?), meus cabelos não estão pintados em duas cores, nem consegui comprar um bom perfume, mas guardo em silêncio o afeto e a atenção de algumas pessoas, acomodo nas bolsas os toys com olhos clarividentes do Tridente, um cd do The Jam e outro de Billie Holiday, alguns livros..., nos olhos ficam os azuis e dourados dos finais de tarde..., na mente, a letra de alguns pagodes![como pude me apai-xo-nar por vo-cê...], no braço descansa uma nova tattoo e por dentro, sangue... jorra muito sangue bom [comprovado em laboratório].

Remexendo jornais guardados, encontrei uma poesia de Manoel de Barros, publicada em 2002, no caderno de literatura do jornal local, que ajudou a explicar minhas disfunções:

A DISFUNÇÃO
Se diz que há na cabeça dos poetas um parafuso a menos
Sendo que o mais justo seria o de ter um parafuso trocado do que a menos.
A troca de parafusos provoca nos poetas uma certa disfunção lírica.
Nomearei abaixo 7 sintomas dessa disfunção lírica.
1- Aceitação da inércia para dar movimento às palavras.
2- Vocação para explorar os mistérios irracionais.
3- Percepção de contiguidades anômalas entre verbos e substantivos.
4- Gostar de fazer casamentos incestuosos entre palavras.
5- Amor por seres desimportantes tanto como pelas coisas desimportantes.
6- Mania de dar formato de canto às asperezas de uma pedra.
7- Mania de comparecer aos próprios desencontros.
Estas disfunções líricas acabam por dar mais importância aos passarinhos que aos senadores.