Meu interior no seu exterior sonoro (parte 1)

O texto a seguir, foi publicado em março de 2006 sob o título 'Das Fragmentações Sonoras' no blog, especializado em música e comportamento, NAORELHA.com, onde fui colaboradora.
Achei pertinente republicá-lo aqui, já que vou continuar com o assunto música e cidade e comentar as apresentações que o grupo argentino BumbumBox realizou semana passada, por ocasião da abertura e programação da Mostra COVER = Reencenação + Repetição, no MAM/SP.
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- Please! A little bit de música na minha vida!

Rebelde, a música está no ar! Escapa, invade, não se sujeita à blindagem e se mistura aos ruídos do cotidiano. Assim, somos surpreendidos por trilhas sonoras, não apenas em clubes, mas ao entrarmos em lojas, restaurantes, ao passarmos por carros e, ...

Em geral nem percebemos, pois muitas músicas não são do nosso agrado. Ou as suportamos e praguejamos contra a poluição sonora das metrópoles.
Mas com algum humor, podemos pensar nestes sons que vazam pela cidade como samples disponíveis (na ‘fono-percepção’ de quem transita pelas ruas) que ao serem capturados, compõem a trilha sonora acidental do nosso dia-a-dia.

Quantos watts de potência e subgraves, as pessoas colocam em seus carros pra fazer vibrar o meu corpo na calçada?

Cada carro que passa com o som alto, cada buzina musical, cada trecho que reverbera acoplado ao corpo de alguém, pelos tecnológicos 'auriculares' ao nosso lado no metrô, no ônibus, na escola... Cada exercício dos ‘pseudos’ músicos que se propaga pelas janelas dos apartamentos, ou das caixas de som das carrocinhas que vendem cds piratas, cada batucada acústica e bandas de um pessoa só em botecos de esquina (nas sextas feiras e finais de semana), cada chamada polifônica dos celulares que cruzamos ou somos cruzados são 'células', nichos sonoros, loops fantasmas e ambulantes que nos acompanham pela cidade.

Sensível a isso, ou não, lá por 1996/1998, Wayne Coyne-líder da Banda Flaming Lips criou dois projetos performáticos.
Surrealmente regeu uma 'orquestra' e compôs algo musical com os cdplayers de 40 carros num estacionamento. Depois juntou uma galera com seus soundsistems e comandou o som dos tapedecks.
Estes projetos chamam-se 'The Parking Lot Experiments' e 'Boombox Experiments' e estão lá no site legal (e oficial) da banda Flaminglips.

É, silêncio é coisa rara... Sons da natureza, então, nem se fala! Estamos mais acostumados com trovões das tempestades e ventos que ecoam por entre os prédios, mas isso não é música (pode inspirar uma!).
É fato que a natureza carente (e meio neurótica) do ser humano teme o silêncio e prefere seguir fazendo muito barulho, falando sozinho, cantarolando, assoviando ou ligando a tevê...
O som dá uma sensação de proteção (é bem melhor quando nós o escolhemos..), mas as músicas fragmentadas da cidade acompanham nossos passos e ouvinte passivo, que nada, podemos cantarolar o resto!
Eu quero continuar ouvindo ORappa que passou com aquele carro... '...O Homem Amarelo do... do Morro/O Hip ...Santa Marta/Agarraram um louro na descida da.../Malandro da ....xada em ter..... angeira...'.